sexta-feira, 18 de março de 2016

Fora da moda

Com o pouco que sobrava de seu salariozinho, conseguiu juntar uns trocos e comprar aquele vestidinho vermelho que namorava há tanto tempo na vitrine, da loja ao lado do restaurante onde trabalhava como garçonete. Nem havia mais vestidinho na vitrine, a moda passara, mas ela sabia que conseguiria comprá-lo numa liquidação. E que felicidade a dela de encontrar a peça lá, a última, pela metade do preço, exatamente o quanto ela havia conseguido economizar!

Decidiu usá-lo na primeira folga do trabalho, um domingo tão quente de sol, muita gente na rua, chegou a estranhar o movimento. Queria sim que a olhassem, e até que alguns homens chegassem a fazer gracejos – o vestidinho caiu perfeitamente no seu corpinho de 19 anos mal completados, delineando uma cintura de moça em forma, ombros e pernas morenos à vista. Naquela grande avenida de domingo não ficou decepcionada com a falta de olhares, e sim confusa com tantos enviesados na sua direção, homens, mulheres, moços, moças, velhos, velhas. Todos a olhavam cerrando sobrancelhas, cochichando, apontando.

Foi quando um grupo avançou sobre ela, logo de cara metendo a mão por trás do vestido. Um puxão só, rasgou nas mãos de alguém, enquanto outros gritavam coisas que ela não entendia. O choro convulsivo de susto mal a deixava tentar qualquer defesa, todos continuavam a gritar contra ela, agora seminua, tapando os seios com os braços, sozinha, no meio de uma multidão.

Resolveram ajudar e lhe deram um manto verde e amarelo pra se cobrir. Viraram as costas e a deixaram como se deixa um cão doente numa esquina qualquer.

Sozinha, encolhida contra uma parede de uma pequena alameda, o choro cessou, e nem por isso sentiu-se mais confortada, muito menos com o manto que lhe cobria.  Queria apenas de volta seu novo vestidinho vermelhinho – agora só em trapos sobre o asfalto de um domingo muito quente. E ela não entendia por que tão quente.

CRiga.


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