quarta-feira, 31 de julho de 2019

A onda gigante


Uma bem-comportada solidão
enquanto caminha nas ruas.
Cada um,
um mundo

A fuzilar e amaldiçoar
aquela falta,
também a falta de cidadania.

A caminhar num vale enxergando na escuridão
demônios anjos negras nuvens tempestades
traumas erros vícios arrependimentos.
Saudades...

Chorando rindo envelhecendo.
Pedindo socorro. Sentindo tesão. Tensão.

Sempre muito só,
triste incomunicável sensatez.

Alguns sentem vontade de se matar.
Outros de matar.
Gritar. Chorar.
Parar com tudo um dia
e só pedir um copo d’água.

Nem sempre aonde a vista alcança
está a paz que se precisa.

Melhor mesmo é assoviar uma velha canção
mesmo na esquina louca, coração quebrado
guarda-chuva furado, garoa extrema-unção.

Pobre podre coração, egoísta de nascença
até morrer.

CRiga.

terça-feira, 30 de julho de 2019

Ao silenciar sobre aberrações, você é uma aberração


Vieram concretando a areia da praia.
Destampando os bueiros –
ratos que transformaram a flauta
em pau pra dar na cabeça de quem pensa.

Como suportar o peso dos paquidermes
por todo o teto, todo o canto?
Eles espremem contra a parede
todo o corpo movido à realidade.  

Vale mesmo o preço emburrecer?
Embrutecer mais o bruto?

Deixar rachar no chão a cabeça da criança
depois do centésimo ataque epilético no dia – 
enquanto no gabinete pensam ser Deus
fabricando novos Lúciferes
pra enrolar na festa dos ignorantes.

CRiga.

segunda-feira, 29 de julho de 2019

Um legado largado no escuro


No futuro, dirão:
“ele tinha um grande amor”.
Tenho vários.

Ou: “ele tinha um grande segredo”.
Tenho vários, também.

Não há nada a se descobrir assim –
entrelinhas
escolas de modernismo
entrevista com amigos e parentes.

Há apenas palavras.
Pontos.
Vírgulas.
E uma vontade louca, porém consciente,
de inflamar a alma novamente
para que ela se lembre de vez quem é,
de quem é.

E isso cabe a mim,
a mais ninguém.

Aqui apenas deixo a forma –
a alma é o meu quarto escuro.
Por favor entre,
mas mantenha a meia-luz.

CRiga.



sexta-feira, 26 de julho de 2019

Militância de flores


Há um Brasil que insiste
invadir minha história de amor.

Trocam-se flores multicores
pelo amarelo e vermelho –
as flores não ficam tão tristes
desde os tempos de Vandré.

Trocam-se poemas por discursos.
A carta anônima romântica
depositada na caixinha do correio,
vira fraca denúncia estampada
em qualquer página de jornal.

Troca-se perfume por gás lacrimogêneo,
vestido chita por camiseta chiita.
Troca-se convite a um passeio
por convocação a passeata.

Eu prefiro sim a flor colhida
à morta pisada no canteiro.
Um coração partido
a tomar partido do terror.

Há um Brasil que resiste
se reinventar histérico
na minha história de amor.

CRiga.

quinta-feira, 25 de julho de 2019

É hora de você achar o trem


Corri atrás do teu perfume na alameda mais longa. Atrasei, você estava morta enterrada com direito a fotinho oval desbotada na lápide de mármore de quinta categoria. Nós somos assim, ricos só de espírito, mas eles aqui não gargalham nem bebem cerveja. O silêncio da perda é o comum.

Há ratos em volta. As pétalas escureceram, apodreceram. Você não vai voltar, então eu vou embora, me desculpe. Não vou morrer contigo. A chuva já castiga, aquela chuvinha tonta de filme de romance europeu, o cara com os pingos caindo pelo sobretudo preto, encharcado, o rosto parecendo derreter. Aqui, verão, eu de bermuda e havaiana, uma camiseta regata que às vezes uso pra dormir.

Lembra? A gente dormia junto, e você tirava sarro dela. Tinha Nossa Senhora, minha tia me deu depois de voltar de Aparecida. “Ai, Santa!”, você gargalhava, embriagada na nossa cama. Depois, nem santa nem roupa alguma – o diabo nos corpos!

Há ratos em volta de nossa casa, como numa música do Clube da Esquina que você ligava na vitrola. Não quero voltar pra lá. É só um barraco, velho, lá ainda tão todas as tuas coisas. Eu me atrasei... nunca houve mesa pronta, mas esperava te encontrar. A gente se esquece das coisas.

Eu vou embora da tua nova casa, meu bem, ela é fria demais demais, apesar de não ter (e querer) onde voltar. Antes, vou quebrar a garrafa pros cacos decorarem tua nova casa. Assim parece mais ainda com a gente. E os ratos: gente boa! Esse cheiro de mijo, você não deu bola pra mendigo, né? Tudo bem, em casa ninguém limpava nada... Mas tudo incrivelmente brilhava. Até esta mesma foto desbotada.

E, por favor, esqueça de apagar a luz – não é agora que você vai se lembrar. Afinal, meu bem, você está morta e enterrada. Só eu que ainda não saquei...

CRiga.

quarta-feira, 24 de julho de 2019

Um engano de vida


Na sua solidão de fila no caixa-eletrônico, pensava em relatórios e contas.  “Oi!”, ela disse, tão linda menina. “Não se lembra de mim, não é?”, emendou, logo com um beijinho no rosto. Não se lembrava. “Ah, deve ser os óculos novos...”. Tirou.

Ele ainda franzia levemente as sobrancelhas, como quem se esforçava em tentar lembrar. “Puxa, não se lembra?”, insistiu ela, olhinhos tristezinhos. Os óculos dele, de aros pretos, também eram novos - por isso os tirou pensando estar com a vista atrapalhada.

“Ai meu Deus, me desculpe... pensei que fosse um amigo meu... desculpe”, foi-se, encolhida, correndinha.

Ele ficou olhando ela ir, parado no tempo, esperando um beijinho de volta. Desabou na decepção de se lembrar quem ele mesmo era. Devagar, vagando, colocou de volta os óculos novos, e reafundou-se em sua solidão de filas, relatórios e contas exatas do salário. Tudo consumido no sustento do lar materno, nada sobraria no fim do mês. Nada.

Só a voz da mãe, irritante: “bonitos óculos, meu filho... você ficou muito bem”.

CRiga.

terça-feira, 23 de julho de 2019

Adolescência


Viajava pela memória
de um coração que já é não meu.

Viajei dancei fiquei
namorei traí galinhei
sofri
ah, como sofri!...

E me arrependi...

Voltei,

eu fui sem guia, muito certo,
ao teu inferno que fundei.

Não te encontrei,
eu fui embora,

eu fui a hora de me tornar alguém.

CRiga.


segunda-feira, 22 de julho de 2019

Barba disfarçada


Saberia me contar, me conter?
Quanto tempo dura a juventude?
Quantos rostos se formam severos
nos tijolos incompletos de nossa obra
nos cobrando dívidas
e atenção?

Eu apenas tenho roupas de guerra
guardadas gomadas num guarda-roupa.
Mas a guerra acabou, a paz é cara,
minha cara agora tem de novidade
apenas uma barba grisalha.
Foi-se o bamba na passeata,
a camisinha estourada.

Verdade que o buraco é fundo?
Último domingo não parecia ser.
Verdade que se acaba o mundo?
O fogão de barro se nega esfriar-se.

Meu desejo é confessar-me temente
à simples natureza das coisas –
ao pé da futura jabuticabeira
descobrir-me então maduro.

À beira de perceber na sombra
da linda segunda-feira
que eu sempre fui feliz.

CRiga.


sábado, 20 de julho de 2019

Bom baiano samaritano

Caetano dá uma avenida
aos amigos bons músicos.

CRiga.

Preza reza


Quando eu tenho medo eu penso num amigo.

Mesmo o medo mais oceano dividido em dois
vendo todo o pecado do mundo atravessar.

Fecho os olhos viro as costas volto logo e caio em pé.

Qual é mesmo o maremoto
que no brinde desiste de nos afogar?

CRiga.

sexta-feira, 19 de julho de 2019

Jabuti


Às vezes parece
que todo o oxigênio do mundo
resolve te pressionar.

Mas ele uma hora se cansa
e a gente vence.

Respirando!

CRiga.

quinta-feira, 18 de julho de 2019

quarta-feira, 17 de julho de 2019

Dia das Bruxas


Dedo na garganta e apropriação devida de coisas que não são minhas. Roubo mesmo, se isso me faz bem. Todos eles roubaram de alguém, e ocultaram o crime embelezando a boneca com batom de vinho seco e barato, aquele que escorre no canto da boca de riso artificial dos lábios plásticos, manchando a pele feito espancamento pela metade.

E eu espanco mesmo neste dia, arranco sangue, crio clássicos hematomas de inocência. E um texto roubado no final não é nada que não se possa explicar na posteridade.

Enquanto isso, declaro às autoridades ter visto tua foto três por quatro, guardada culpada pelo crime, desbotada na carteira velha - meu coração não é selvagem, é apenas marginal que comete crimes, acusa inocentes e oculta cadáveres.

Inocente? Você foi embora roubando meu disco do Elvis por causa de Suspicious Mind, apropriação devida. Apropriação de vida, pra sobreviver sem mim na marginalidade…

Feliz aniversário, mas vou ter que te matar mais uma vez agora. Deixe que noticiários contem as mentiras, porque a verdade nós dois sabemos: ninguém morreu, meu bem, ninguém. Textos renascem todo dia, e os discos estão voltando à moda. Menos nós, sobreviventes sem graça, grafados perdidos sem valor moral, feitos classificado de jornal…

CRiga.

terça-feira, 16 de julho de 2019

Guerra santa


Na guerra
erra ao olhar demais pra ela.

Peca,
a igreja é mais um puteiro
que a fria solução dos fracos.

Embaraços, pernas grossas,
se houvesse religião se jogaria
aos seus pés, lavaria seus pés,
adoraria.

Na terra o cheiro é mais forte,
o sangue menstrual aduba
o transe do girassol depois da chuva –

acredita é no barro,
no carro de portas abertas
pronto pra fuga
pra qualquer Paris que se invente.

Qualquer país onde a guerra
seja santa, vestida decote
e saia curta no altar.
A cada bombardeio, escondida
numa catacumba diferente,
um perfume a denuncia.

Beato cretino nenhum tem coragem
de abrir a santa sepultura rosa choque,
encará-la pedindo olhares e amores
além daqueles que as mãos juntas
oram queimando ateus.

Na guerra
ele escondeu todo o seu tesouro
debaixo do véu da santa.
Véu transparente,
pobre santa desnuda
rogai por nós!...

Santa viva no bater dos sinos
anunciando, feito raios e trovões,
a agrura de um corpo
que só quer comungar prazer.

CRiga.

segunda-feira, 15 de julho de 2019

Um olhar profissional


Encontrei de novo às duas da manhã. Depois da boate, das bebidas, dos cigarros. Depois de você vender seu corpo a quem pagasse bem, loira linda que você é. Não ia pagar. Não ia querer ter teu corpo por profissão. Apesar de querer muito, como queria!... Mas pagar seria me trair e matar o seu olhar. O seu olhar brilhante naquela meia luz de boate. Olhar pra mim, sentado te amando com os olhos, uma vida inteira. Um sorrisinho meigo de canto. Fugi na noite pra encontrar você.

O mesmo olhar brilhante agora sobre aquele viaduto, você de cima, no peitoril, o decote e os seios lindos apoiados no concreto muito velho do Centro da cidade. Os meus olhos acompanhavam teu corpo, horizontal saindo do peitoril até o par de pernas, cruzadas à altura da canela, um pezinho de ponta, ao lado do outro, de apoio. Linda, de blusinha vermelha e saia jeans preta. Sapatinhos pretos também, tipo bailarina, de pano. E os olhos brilhantes olhando o nada além daquele viaduto. E mais aquele sorrisinho meigo de canto, na boca batom vermelho.

E me perguntava se valia a pena ir conversar contigo. Se me daria atenção, apesar dos olhos brilhantes lá na boate. Pensava: bobagem minha, não vi olhar pra mim. E me contrariava. Não, eram pra mim, sim! Diferente daquele olhar profissional caçando homens. Olhou pra mim de forma diferente. Olhou sim!... Olhou?... E o sorriso, aquele cantinho da boca linda vermelha era meu? Era meu, só podia ser, só eu vi!... Eu vou lá!

Daí cheguei.

Boa noite.

Oi.

Distante?...

É...

Cansada?

Não...

Esperando algo?

Já encontrei!...

Beijos. Mais beijos, fundos, profundos, ardentes. O batom vermelho borrava minha boca, minha mão já passeando por baixo da tua saia, a tua mão por baixo da minha calça. Linda, loira!... Duas da manhã, ninguém passava, você agora sentada no peitoril, eu no meio de teu lindo par de pernas, e a noite que era quente demais!... Quente. Explosão. Morno. Suor. Sorrisos. Olhar brilhante. Profissional...

Aqui é um pouco mais caro, amor. Um pouquinho só...

Um olhar profissional. O meu, de brilhante a fosco. Cor da noite quente vermelho Vênus ferido sangrando por cima da minha cabeça quente zoeira olhar profissional se apagando um empurrão um grito uma noite um olhar distante um olhar mais distante um barulho seco no asfalto quente lá embaixo. Um olhar profissionalmente morto no asfalto quente vivo.

O meu olhar era de verdade. E não mentiu nem na hora que o desapontamento vermelho apagou seu brilho. Fui embora, ninguém viu nada. Voltei pra boate. Paguei no caixa. Me deixei esquecer. Sirenes ecoavam. Eu bebia uma cerveja.

CRiga.


sábado, 13 de julho de 2019

Campari


Você beija e eu não beijo,
e a vida segue...

Amanhã, segunda-feira,
o resto da semana ninguém vai lembrar
nem ligar.

Paguei em dia a conta e ninguém liga.
Ninguém liga pra mim.

Quem não paga a conta que eu pago
usa o fogo que não tenho
pra mandar mensagem, agendar encontro,
sob o meu triste e calejado calcanhar.

CRiga.


sexta-feira, 12 de julho de 2019

Descansar carregando pedras


Luzinhas de Natal pouco dizem, meu amor,
Papai Noel é apenas um lenhador operário
e minhas florestas não dormem mais
não são os verdes da prometida paz.

É o que faço: marreto certeiro com a machada,
corto com calma, carinho e distraído
as esperanças que não são minhas.

Depois planto planta de verdade
porque ninguém mesmo vive
só de vender lenha pra queimar.

CRiga.


Pequeno sarau


Somos apenas nós mesmos,
então destranque seu Drummond
de volta à fogueira.

CRiga.

Para sempre brisa


Há sempre quem te apresente salvadoras luzes,
possíveis interruptores na parede de nuvem.
Quem te ofereça participação na prece,
se apresse, ele pode morrer sem tua postiça fé.
Há até quem te ache a fonte das bonanças,
do “tá tudo sempre certo, não se preocupe”.

Não.

Luzes de Natal não me orientam,
apenas enfeitam o garrafão psicodélico.
Tenho fé é na pedra que se move
sem precisar da fé que move montanhas.
Tá tudo sempre certo, bem perto
de você não estar me dando no saco.

Sim.

Posso não ter as receitas mágicas e mesmas
de todo final de ano que precisamos encarar.
Tenho apenas o passo, a vontade retesada,
o peso de nenhuma idade,
de nenhum compromisso.

Por isso me desculpe pela mesa nunca pronta,
por planejar apenas como não muito te decepcionar.

Eu sou apenas um ensaio de esperança,
um sopro do planejar da rota.
Anota meu recado se precisar:
eu não sou santo muito menos anjo,
mas não sou o mal gosto
da tua ceia que não deu certo.

CRiga.

O morro que não é mais nosso


As mazelas esperneiam
e o esperma corre as pernas.
É quando o triste fecundador
desiste do mundo mundano –
um bebê morre anjo
feliz angelical.

As janelas estão fechadas
e os beirais têm rosas secas.
A cidade está de olhos cerrados,
fingindo um sono, talvez embriaguez,
para aliviar a dor.

A luz da tevê ilumina um barraco,
e o cheiro do jantar se mistura
ao pó da casa fechada
em pleno verão.

Os gritos daquelas crianças
estilhaçando as alegrias de infância,
hoje fazem parte da canção de ontem
no vinil velho comido pelo tempo.

O batom que era da camisa de seda
virou sangue de execução na mesma esquina,
onde cantava a boemia
uma vida mais bonita.

Aquela seresta virou faroeste,
e o oeste virou medo no pôr-do-sol –
é quando morre na esquina
mais um inocente trabalhador.

Não há caminho de volta ao lar –
há via crucis no chão de terra batida
onde Cristo podia bem ter caminhado,
não fosse a cruz virar arma branca
pra dar na cabeça de bandido
e de penhora à polícia.

Não há caminho aos novos fecundadores –
o espermatozóide tem medo da missão
e canta assoviando uma musiquinha
sucesso de antigamente,
pra disfarçar sua tristeza
de ter que dizer não.

CRiga.
(foto de Antonio Lacerda)

quinta-feira, 11 de julho de 2019

Sob o mesmo teto


Há sorrisos e concessões, dúbio silêncio.
Há colunas que aguentaram o teto em pé
suportaram o terremoto dos erros
na velha casa hoje habitado mausoléu.

Já no teto do céu nem as estrelas são as mesmas.
Ela observa a noite escura
esperando se apaixonar de novo
por alguém.

Duas camas. Dois quartos.
Dois fantasmas se assombrando
quebrando espelhos em eternos anos de azar.

CRiga.



Entre os lábios


A língua draga com fogo de dragão,
beijo que chupa a pele do pêssego morno
ou boca caindo de boca
na doce manga de estação.

CRiga.

sábado, 6 de julho de 2019

Deixe estar


Esse frio é tão clássico
como Let it Be.

É a procura pelo dia
em que necessário de fato será
não precisar provar nada para ninguém.

CRiga.

sexta-feira, 5 de julho de 2019

Viúva


Procura por algo no fundo da gaveta
e apenas o rosto coberto pelo pó
na velha fotografia
denuncia.

Você não morreu
e os barbitúricos acabaram.

Abrir de manhã a janela molhada,
o gesto simples e simbólico pra continuar:
é como amputar os braços, se salvar
procurando no brilho tímido do sol
um sorriso-motivo pra acreditar.

Trocar a cama, os lençóis, o travesseiro –
tem aquele buraco irritante que sufoca.
A cada manhã faço uma promessa nova,
minha pressa é amiga da cicatriz vermelha.

Minha reza por um triz não é lamento.
Eu quase não lembro mais o dia
em que morri junto a você. 

CRiga.


quinta-feira, 4 de julho de 2019

Compromisso caseiro de vida – remake


Fórmulas mágicas,
deixar de querer adivinhar o futuro
a partir dos parcos sinais de hoje.

Faz tempo que sente a apreensão
do gênero operário.
A ameaça dos Brasis de hoje
declarada apenas na balbúrdia
dos recentes vencedores.

Antes
houve apenas o remoer de não se lembrar
como se faz alguém feliz.
A incapacidade de fazer feliz.

A incapacidade de se partir estas correntes
donas do seu amanhã.
De moldar o futuro dos filhos
a partir de sua vontade e certezas colhidas
de uma vivência plena, independente –
não de favores dos vendados olhos do poder.

Será que existe o tal do “dono do destino”?

Apenas ele vê a varanda ameaçada
quando este vento torto faz a madeira bater-se
querendo despertá-lo da languidez.

Mas ela ainda lembra o pito dividido
da Mariquita de Drummond.

A voz dela lhe abala
quando ele fala sobre seus medos.
Mas a voz dela também lhe acalma
como o rio profundo
que atravessa a cozinha de Adélia Prado.

“Lembre-se de nosso vinho de hoje à noite.
E pare de se coçar!”

CRiga.