domingo, 8 de outubro de 2023

Fetiche

 

Enfim a gente encara porque a cara cansada
Fez a barba.

Enfim a gente se embriaga porque a bebida
É a mais barata.

Enfim a gente se encontra de novo na noite
A gente plantou encontros dissonantes.

Enfim o jardim deu aquela flor.

Como é maravilhosa a impossibilidade do amor.

CRiga.




quarta-feira, 4 de outubro de 2023

Noite no sertão

 

À meia-luz a morte loira caminha tranquila
Vestido branco na cozinha ainda morna.

Vagalumes bêbados flutuam
Não há saída de emergência.

Madrugada é a brasa que se confunde
Moribunda na solidão do fogão à lenha.

A velha na cama sussurra preces de perdão
Estende a mão ao vazio do quarto escuro.

O vento leva embora lençóis surrados do varal
A rosa murcha doa pétalas perfumando o ar.

A madeira no chão range abandonos
Cinzas são o tapete da visita.

Jesus chega manso à porta entreaberta
Sorrindo a paz de um quase dia qualquer.

Indicador nos lábios sugere silêncio
O som é apenas um click de interruptor.

O sol nasce apagando a dor.
Hoje não tem cheiro de café.

CRiga.



segunda-feira, 2 de outubro de 2023

Limão

 

Me esqueci no fundo de um copo
Cheio de preocupações alheias.
Não posso mais ser areia de ampulheta.

Quando eu me encontrar quero ver você
De novo de branco encanto.
Eu canto, sorrio, gargalho e te levo –
A vida não é isso que a gente fixa num quadro.

Na minha taça há um suco que me embriaga
Na minha vida há uma fome de agora,
Não há mais tempo de reclamar.

Quando chegar este domingo incerto
Quero apenas saber qual é o prato do seu dia.

Quero apenas a certeza de um tempero
Que ainda traduza aquele velho e bom amor.

 CRiga.