quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

A chuva dos cinquenta

 


Enquanto a chuva cai num chavão eterno
Minha rima no inferno quer se afogar na certeza
De que o excesso vale mais que o impresso velho
Colado no poste mijado pelo vira-lata amigo.

O conhaque sob o sobretudo denuncia –
São Paulo ainda é a mesma amiga linda e traiçoeira.
Eu me apaixono e alguém me derruba fácil na sarjeta
Só com um desvio de olhar esguio.

Quando eu morrer, Mário,
Quero sirenes nas lojas de discos que não existem mais.
A inocência daquela juventude de não ter como voltar pra casa
Na madrugada depois da noitada embriagada de esperanças.

Eu acariciava seu rosto com as costas das minhas mãos,
Havia a poesia serena de um filme italiano.
No pulso fino havia um reloginho que foi roubado,
No peito lindo havia um segredo nunca desvendado.

E eu, garoto dependurado nos ônibus das madrugadas frias,
Não me importava com nada nada.
Atravessava cidades no meio da semana que não me cansava
Só pra ver você sorrir pra mim.

Hoje a chuva cai distraída, provoca um ai.
Cada gota que cai pesada
Parece uma lágrima que um dia eu chorei.

CRiga.