Ele
não sabia que, entre as suas pernas enquanto sentado no corrimão do cursinho,
ela sorria pedindo sua atenção. Ele não sabia que o coração era tão traiçoeiro
quanto o tempo, que não curava feridas porra nenhuma. Ela cantava aquela canção
do Robert Plant, dizendo que se lembrava dele na hora em que loirão gritava “I burn in love(*)”... Ele sabia inglês,
mas não quis saber o que significava.
Anos
depois, visitou-a sem culpas de entender. Na verdade sem mais nada – naquele
coração cego e surdo por sensatez jazia o vazio de uma tristeza incomunicável,
um tempo cinza chuvoso de setembro e um vagar pela cidade e parar na sua casa
para um oi.
Almoçou
com ela e com a mãe, o almoço do pai falecido. Ela tinha novos discos, e
conseguira achar aquele do Terence Trent D’arby, com “Seven More Days”, de um velho comercial de jeans em que o cara
ficava um tempão esperando a namorada se vestir, ele num carro conversível, fez
sol, fez chuva, e ela sai vestida no jeans perguntando: “demorei?”, e ele
responde: “não, acabei de chegar”.
Eu
demorei... um namorado viria vê-la amanhã, ele gostava de Beto Guedes e
Belchior. Eu não conhecia, mas sabia do “não dá mais” brusco do seu olhar. Ele
a conhecia. E ela o conhecia, e sabia que saindo dali ele compraria discos do
Beto Guedes e do Belchior. E comprou mesmo.
Ele
foi embora não arrependido de ter ido, nem arrependido de ter se feito cego
anos antes, nos corredores e corrimãos do cursinho, ou à caminho do ponto de
ônibus depois das aulas encerradas tarde da noite. Foi embora arrependido de
nunca ter convencido ela que sabia dos olhares pedintes, das traduções, dos
códigos tão jovens. Arrependido da insistência em dizer amiga, amiga... Amiga,
palavra triste quando se perde um grande amor...
CRiga.
(*)
“29 Palms”, Robert Plant
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