Dali a pouco ele chegaria, provavelmente com um buquê de flores, um
vinho, e depois da novela fazer amor, na sala, no quarto dos pais ou no seu,
cheio de bichinhos de pelúcia nas prateleiras cor-de-rosa. Há quase um mês
papai e mamãe viajavam pela Europa, e ela sozinha porque tinha de ir pra
faculdade - não ia. Mas o professor vinha na casa dela. Nem novo, nem tão mais
velho. Chegava todo dia na hora da aula com um presentinho, um vinho, um licor,
flores, jóias... Gostava muito era dos bombons e de sua boa conversa.
Até aqueles seus dezenove anos não tinha experimentado nada assim. Nem
sabia o que era se apaixonar. Poucos dias atrás tinha perdido a virgindade na
cama dos pais, o professor. Todo dia ele vinha, todo dia ele falava muito, e
ela se perdia no olhar dele, no beijo, no sofá, na cama. Aventura. Amor.
Mas aquele dia ele não chegava. ‘Tão pontual, gosta tanto de mim...’ A
impaciência dela já chegava à perturbação. Foi pra faculdade procurar por ele.
Ligou o carro, acelerou forte.
Na esquina, o escuro, mas ela viu: o professor e aquela loirinha da
turma de Psicologia. Beijos e mãos passeando por baixo da saia da menina, por
dentro do zíper da calça social do professor. E ela viu tudo, do meio da rua.
Tudo parou, menos seu carro. Acelerou forte, muito forte, muito ódio. Dali a
muito pouco, menos uma árvore na rua da faculdade, menos gente enganando gente
nesse mundo confuso que era cor-de-rosa agora vermelho sangue, antes ursinhos
de pelúcia agora ratos de esgoto, antes bombons de licor agora de ácido
sulfúrico. Deu meia volta, não voltou pro lar.
Hoje mamãe e papai não sabem em que casa noturna ela vende seu corpo.
Uma cicatriz na alma, um mistério, e uma cara de menina que faz sucesso. Por
vingança, cobra caro, muito caro. E muitos querem, porque ela chega atropelando
com seu corpo de menina-mulher, fala pouco, os homens gostam de suas roupinhas
tipo universitária de Moema. No quarto eles sorriem e sentem tesão com a
prateleira e um ursinho de pelúcia encardidinho.
Mas ela exige respeito. Quem sabe um vinho, uma flor, menos caixa de
bombom, muito lero ou aula de romantismo. Homem bom é o que chega, paga, come,
e vai sem falar o nome. Deixa vazio o que vazio está. De manhã vai dormir,
consciência tranquila e agarrada ao ursinho encardidinho. Menina-mulher que
dorme enfiando a mão naquela bunda de pelúcia, contando os dólares do dia.
CRiga.
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