segunda-feira, 30 de novembro de 2015

A esquina cega


Se essa rua se essa rua fosse minha, eu fechava só para você passar. Mas um de nós quebrou estrelas sem autorização dos deuses solitários. Os cacos ainda estão naquela esquina. Naquela maldita esquina que você não quis mais quebrar.

E ela não quebrara mesmo aquela esquina. Como vingança de tempos ginasiais, quebrara sim a promessa de passar por ali novamente e irem juntos ao ponto de ônibus. Ele ficou esperando, tempos e tempos, à frente o portão, à espreita da janela, mas a hora ia vencendo o desejo e a noite escurecia sua esperança que era morena.

Ela nunca mais passou por sua rua. E ele nunca desistiu, e mesmo depois de anos, passados namoradas e casamentos, sempre que ia à velha casa da mãe olhava em volta na esperança de vê-la passar. O seu sonho juvenil, o seu sonho que nunca morreu. O seu sonho que quebrou uma promessa e nunca mais passou por ali, deixando ele com aquela vagacidade no olhar, na vida, aquela saudedezinha besta juvenil, tão doce que sempre voltava ao portão da casa.

Um dia ela vai voltar, não apenas nos sonhos mais intensos, aqueles que ele acordava suado com tantas saudades do que não foi. Ela voltaria mais tarde, na hora certa, que sabe tão tarde que a hora certa seria apenas um eco descendo a rua à procura de sua cor morena.

Ele nunca tirou os olhos e o coração daquela maldita esquina. Envelheceria à espera, mas a veria na curva, subindo a rua à caminho do ponto de ônibus. E ofereceria, de novo, sua companhia. Ela aceitaria. E cúmplices do tempo perdido, promessas perdoadas, as mãos dadas naturais falariam tudo, diriam tudo o que nunca foi.

Depois disso, um ônibus qualquer os levaria. Já não importava destino, só o reencontro. A esquina maldita para trás, a avenida larga pela frente. E um olhar daqueles tristonhos, de tempos que se arrastaram quase eternos à espera, uma vontade de esganar a vida, voltar no tempo e maldizer os desencontros. Mas não precisava. Mãos dadas no finalzinho da rua, passos lentos, breves relatos, amores que não deram certo, saudades e doces lembranças.

Da esquina cega, apenas um muro novo protegendo um novo lar, na rua onde ela vai voltar. Tem que voltar. Assim termina toda a história com final feliz.

Se essa rua se essa rua fosse minha, eu fechava só para você passar.

CRiga.



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