A espera parece mais longa quando a chuva cai. Meus amores, minhas dores – no asfalto molhado todos perambulam com seus guarda-chuvas, cada um com sua cor em uma via sem volta.
A
espera é fera que hiberna nas trevas da alma. Ruge uma dor que ecoa do fundo da
caverna úmida e que cheira a mato molhado.
Quem
espera sempre dança uma valsa de solidão no silêncio da casa fria. Casa com o
padre, reza com o bêbado caído na esquina.
Me
espera, não vai agora. Eu tenho cartões postais em branco pra gente sonhar. Um
vestido de festa e outro de casamento. Um baú vazio mofando no quarto, uma
garrafa intocada de licor. Uma cama de solteiro, a gente joga o colchão no
chão.
A
chuva da espera molhou toda a minha casa, distraída deixei janela aberta pra
alguém me invadir. Eu queria ter asas pra voar até alguém. A espera parece mais
alta quando o céu se abre e o sol não traz mais novidades.
A
espera se transforma, com as nuvens sombrias em torno da lua, na noite que cai
da minha estante e se quebra mil caquinhos, um porta-retratos ainda com foto de
revista. Um anjo azul de bibelô empoeirado, lembrança de um sobrinho que
nasceu, cresceu e viajou ao estrangeiro.
A
espera é acreditar em filho de virgem. Uma prece, me esquece, me marca num
muro, prefiro ser Madalena. Me atira na vida mas não me espere chorar. No
compasso do ponteiro do relógio parado vou te atraindo pra armadilha: serei a
bruxa que vai te transformar no sapo, você será meu anfíbio de estimação e terá
que esperar um beijo meu te libertar de novo. Só que meus lábios secarão com o
ar cortante de outono. Estaremos presos um ao outro.
A
espera é o brejo feio e fedido da floresta negra das fábulas que assustam as
crianças. É a impossibilidade de contar belas histórias aos casacos pendurados
na cadeira da sala de jantar. É a solidão dos deuses loucos. É o dedo em todas
as feridas da trouxa autocompaixão. Rasgar a carne, sangrar líquidos sem cor,
chorar lágrimas imaginárias e etílicas de guaraná. E dormir soluçando baixinho
esperando o despertador tocar pra espera recomeçar com o dia sem as flores à
porta.
Café
amargo, janela aberta, estou pronta – que venham as cartas em branco que ontem
enviei pra mim.
CRiga.
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