quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Alugar teus olhos


Dizem que falar sobre os próprios monstros que corroem a alma acalma o espírito, desacelera o coração de compasso amargo, crava aos poucos o punhal mágico da sonolência no Godzilla de hoje em dia – ele arranha com suas garras pegajosas por dentro do corpo que precisa continuar numa nova luta que a gente mal sabe qual é.

Dizem que o luto é relativo. Alguém morre sem ter dito algo importante, outro deixa carta e sela destinos – pronto, não há por que duvidar, não há por que parar para pensar. Mas o morto puxa suas pernas por madrugadas e naqueles dias do sol que gargalha da sua cara, a vida continua, meu velho, o mundo não vai parar de girar por causa do teu umbigo molhado.

Dizem que quando te matam e te deixam vivo, os vivos do lado de lá não explicam se é bala ou espoleta, e a você só resta acreditar que ainda vale pelo menos um vintém. Alguém te mata depois do jantar, depois até da sobremesa, e abandona teu corpo na chuva esquisita da indiferença. Difícil crer, difícil falar, mas não resta muito a não ser alugar nem que seja a folha em branco de um caderno que não quer se manchar com tuas mazelas.

Dizem que morrer pode ser bom. Dizem que renascer é muito melhor.


CRiga.


Nenhum comentário:

Postar um comentário