sexta-feira, 29 de novembro de 2024


 

Toada de um amor vagabundo

 


Desmazelo, vovó diria
Até o dia
Que eu pedisse desculpas a Glorinha.

Amor cachorro…

Depois diria essa menininha é ouro.
E eu dando no couro
Mas evitando bisnetos dela –
No meu tempo santa é a camisinha.

Bandido!

Depois brigaria de novo.
Glorinha que era minha deu pra outro!
E vovó não sabendo de nada
Disse o que parecia tudo:

Glorinha dá pra quem quer
E você que não a trate bem
Que vai virar piada também
Na cama de quem a comeu.

Peguei um trem.

Então matei Glorinha
E na volta chupando sorvete
Apontei a mesma arma para vovó:

Mate que sou mesmo velha...
Pelo menos no inferno onde vou
Ouvirei com gosto feito mãe ausente
Glorinha falando que amava você
Que doce diabinha!

Que graça que a vida tinha?

Vovó só morreu de velhice
E nem pito me trouxe na cadeia
Antes de a corda amarrada no teto
Dar cabo de minha vida
Naquela cela fria.

Glorinha?
Virou santa e ganhou devotos
Com pôsteres de borracharia.

𝐂𝐑𝐢𝐠𝐚.



terça-feira, 26 de novembro de 2024


 

Fronteira

 


O trem no subúrbio passa implacável
Como um monstro de aço.
Estremece feito terremoto
As casinhas de papel.
Sacode os frágeis tapumes
Em forma de abrigos
Da favela fantasma.

Mas a arquitetura improvisada
Arte eternamente sem dinheiro
Não cai.
Imponente (do seu jeito) joga nas caras
A sofrida sobrevivência.

Porque a pobreza é assim:
Enquanto não descarrila o trem
Pra dentro da favela fantasma,

Tudo é
Cotidianamente
Apenas transparente.

CRiga.




terça-feira, 12 de novembro de 2024


 

Domingo de despedida

 


Chegaste sexta-feira um vendaval que eu senti
Depois a brisa do sábado que beija o rosto
Me salvando da cabeça panela de pressão.

Amanhã tem dia de manhã de sol
Uma segunda-feira de primeiras intenções.

Aqui só me resta as planilhas de guardanapo
Trezentos quilômetros de poesia.

CRiga.




sexta-feira, 8 de novembro de 2024


 


Na esquina da minha vida

 


Garimpo sorrisos sobre a rocha lisa do desencanto
Porque meu coração de pedra só aprendeu a ser só.

Ensino o nó do marinheiro mais antigo do cais
E no mais
Sou o som da gaita solitária ao pôr do sol.

Nas esquinas assovio um samba esquecido.
Mas a fogueira densa no tambor do frio do inverno
Também me lembra um velho e triste blues.

O cheiro do asfalto molhado.
O som do pneu contra a chuva.

Eu sempre amei
Como o último amante noturno da cidade que dorme.
Havia luzes refletindo um neon de esperança etílica
Uma avenida cheia de carros que nunca me levariam
A lugar algum.

Era o fim da avenida da minha vida
E eu quebrei a última esquina.

Foi quando ali havia você de batom vermelho
Me sorrindo, me esperando
Abrindo caminhos, memórias e sensações.

Uma alameda de flores e primaveras
E uma perfeita chuva fina
De eternos amores imperfeitos.

CRiga.