Lídia olhava a caixinha
de música quebrada. Deveria chorar, mas não chorava. A bailarina manca e a
música desafinada já não afetavam mais.
Lídia não esqueceu o
batom vermelho na bolsa, nem o preservativo comprado, em segredo, naquela
farmácia de esquina. A inveja da solteirona do balcão podia denunciar. “Foda-se!”,
palavra da moda.
Lídia deixou pra trás
uma vida de menina. Perdeu vontade de chorar por brinquedo quebrado, perdeu a
atenção nos bordões da mãe, perdeu a doce virgindade lenda das conversas de chá
da tarde.
Enquanto destoava nos
gemidos, misto de dor e de novo prazer, uma bailarina manca fazia as malas. Não
havia príncipe nessa história de amores perfeitos, porque nem Lídia
esperava telefonemas de dias seguintes.
Nem mesmo aquele
soldadinho de chumbo, herói de outrora a declamar poemas ao pé da caixinha, havia
mais – perdeu uma perna na guerra da puberdade, e aposentou-se beberrão numa
cadeira de rodas pela cidade dos brinquedos fantasmas.
E o amor, descrito num
velho livro de contos de fadas, agora apenas mascava chicletes despreocupado, parado
na chuva com guarda-chuva furado, esperando um ônibus qualquer.
CRiga.
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