Na sua solidão de fila no
caixa-eletrônico, pensava em relatórios e contas. “Oi!”, ela disse, tão linda menina. “Não se
lembra de mim, não é?”, emendou, logo com um beijinho no rosto. Não se
lembrava. “Ah, deve ser os óculos novos...”. Tirou.
Ele ainda franzia levemente as
sobrancelhas, como quem se esforçava em tentar lembrar. “Puxa, não se lembra?”,
insistiu ela, olhinhos tristezinhos. Os óculos dele, de aros pretos, também eram
novos - por isso os tirou pensando estar com a vista atrapalhada.
“Ai meu Deus, me desculpe...
pensei que fosse um amigo meu... desculpe”, foi-se, encolhida, correndinha.
Ele ficou olhando ela ir, parado
no tempo, esperando um beijinho de volta. Desabou na decepção de se lembrar
quem ele mesmo era. Devagar, vagando, colocou de volta os óculos novos, e reafundou-se
em sua solidão de filas, relatórios e contas exatas do salário. Tudo consumido
no sustento do lar materno, nada sobraria no fim do mês. Nada.
Só a voz da mãe, irritante: “bonitos
óculos, meu filho... você ficou muito bem”.
CRiga
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