quarta-feira, 16 de março de 2022

Bairro

 


Havia muitos quarteirões,
mas o trajeto automático da bicicleta
era sempre aquele quadrante exato
a rua exata, aquela casa.

Uma vez descemos a rua
mãos dadas, eu olhava pro asfalto.
Outro dia a consolei lá embaixo
dedinho machucado pelo rolimã.

Mas eu tive de mudar, tristeza,
atravessava bairros pra ver a menina.
E ela não sabia (ou fingia não saber)
por que tanto eu caminhava.

Um dia chamei a menina de “beleza”,
coisa de criança, correu atrás de mim.
Fui embora, vergonha, demorei pra voltar,
sofri as dores de moleque com saudades.

Paixão de infância falou mais alto
e voltei,
mas a casa vazia me esvaziou...
“Foi embora... pro Rio, parece...”,
disse uma amiguinha, olhos sem atenção.

Desde então cresci, vários amores.
Cresceram também as casas,
sobrados e edifícios.
Semáforos, contramão, buracos e desvios.
Tudo ficou difícil.
Tudo ficou proibido.

Estes dias passei por lá de carro,
e meu filho mal deu bola
à minha história de primeiro amor.

CRiga.


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